O juiz Fernão Borba Franco, da 14ª Vara da Fazenda Pública, determinou que, a partir do dia 30 de janeiro de 2015, o Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo (Detran-SP) pare de cassar ou de suspender as cartas de motoristas cujos recursos ainda estão sob análise jurídica. Nem mesmo quem for flagrado bêbado ao volante poderá ter a carta cassada ou suspensa imediatamente.
Após a decisão judicial proferida na sexta-feira, o Detran informou hoje que vai parar, a partir de setembro, de fazer os bloqueios administrativos das CNHs de condutores que atingem 20 pontos, mas que não tiveram seus casos considerados “trânsito em julgado”. “Isso, porém, não os exime de responder ao processo administrativo instaurado para suspensão do direito de dirigir”, informou a assessoria do órgão. O Detran também diz que adotará o nosso sistema solicitado pelo Judiciário a partir de 30 de janeiro de 2015.
A decisão de Borba Franco atende a pedido feito pelo promotor Valter Santin. Ele abriu inquérito civil no qual constatou o bloqueio sistemático de carteiras antes dos recursos das infrações serem julgados, o que tem levado o Judiciário a receber uma série de ações com pedidos de liminar (decisões provisórias) para assegurar o direito de dirigir dos motoristas.
O próprio Judiciário havia alertado o MP sobre o fato de “milhares” de motoristas estarem entrando com mandados de segurança para poder continuar dirigindo. A Promotoria também levantou dezenas de decisões concedendo o direito de dirigir nessas situações. Mesmo quem é flagrado embriagado consegue hoje protelar, com a apresentação de recursos na Justiça, por até dois anos a decisão sobre a suspensão de sua carteira.
A investigação da Promotoria de Justiça e do Patrimônio Público apontou que hoje são abertos no Estado 600 mil processos administrativos por ano para a apuração e aplicação de suspensão ou cassação da CNH. Metade é julgada procedente e os motoristas perdem suas carteiras. A suspensão varia de 1 a 12 meses.
A suspensão ocorre quando o motorista comete infrações e atinge 20 pontos na carteira em 1 ano – ou por alguma falta que leve diretamente a essa sanção, como dirigir embriagado. A cassação é feita contra motoristas infratores que já estavam suspensos.
Além de perder a carta, o motorista hoje pode responder por crime se for flagrado com a CNH bloqueada pelo Detran. Mas, pela nova decisão da Justiça, esses motoristas só poderão perder a carta quando todos seus recursos já tiverem tramitado nas esferas do Judiciário. Especialistas em trânsito também afirmam que a punição de suspensão ou cassação só pode ser aplicada após esgotados os recursos apresentados pelo infrator.
Somente de neste ano, de janeiro a maio, foram feitas 195.797 notificações a condutores que podem ter o direito de dirigir suspenso. Muitos motoristas são notificados da suspensão quando seus recursos ainda estão em análise na Justiça, segundo a Promotoria do Patrimônio Público.
Maurício Januzzi, presidente da Comissão de Trânsito da OAB, considera adequada a decisão da Justiça. “Pela nossa Constituição, o princípio do ‘estado de inocência’ deve ser respeitado. Não adianta suspender a carta e depois uma avalanche de ações de motoristas começa a chegar na Fazenda Pública”, argumenta o especialista. “Se for analisada a lei, o motorista tem esse direito dos prazos dos recursos. É legítimo”, acrescentou.
Procurado, o Detran informou que vai se pronunciar em instantes sobre a decisão judicial. O promotor Santin disse ao Estado que recorreu da decisão judicial para tentar aplicar a mudança das regras na suspensão das CNHs ainda neste ano.
Estadão