Numa aula, num curso de pós-graduação, o palestrante começou dizendo: “Antes os juízes tinham tempo para ler as grandes peças jurídicas, elaboradas pelos bons advogados, quase num estilo rococó”. O advogado da parte adversa, diante do trabalho primoroso de seu colega, tinha, por obrigação, de não passar vexame e, da mesma forma, elaborar uma belíssima peça jurídica. O Ministério Público, sempre fiscal da lei, quando atuava no feito, diante das peças dos advogados, da atenção do juiz às causas postas, não podia deixar, da mesma forma, apresentar um bom arrazoado, até porque, com toda a certeza, a sentença final, seria primorosa. Isso se deu antes da atual Constituição Federal de 1988.
Com a Constituição de 1988, inovam-se alguns paradigmas de acesso à Justiça e o Constituinte originário, sem avisar aos jurisdicionados e mesmo a todo o Poder Judiciário, leva os juízos e tribunais uma avalanche processual, da quais os mesmos não estavam preparados, condignamente com pessoal administrativo, fóruns acessíveis, mobiliário adequado e, a luta de sempre, salários, para tanto trabalho, que se tornou um enxugar gelo.
O Constituinte originário criou o Superior Tribunal de Justiça. Deveria a Suprema Corte ficar, exclusivamente com questões constitucional, isto é, que com ela não estivesse nos conformes. Tornou-se protagonista do Executivo e do Legislativo (talvez até por culpa deles próprios). Fosse na Constituição de 1824 seria o Poder Moderador, que cabia ao Imperador.
Sem dúvida isso é uma evolução da doutrina do neoconstitucionalismo.
O neoconstitucionalismo visa refundar o direito constitucional com base em novas premissas como a difusão e o desenvolvimento da teoria dos direitos fundamentais e a força normativa da constituição, objetivando a transformação de um estado legal em estado constitucional.
Esse constitucionalismo hodierno relaciona-se, diretamente, ao termo “constitucionalização”, que a doutrina costuma distinguir em algumas acepções. Fala-se, nessa linha, em “constitucionalização” para aludir ao advento de uma Constituição escrita, revestida de supremacia e, pois, em posição hierárquica superior às demais normas do ordenamento jurídico, consignando um processo histórico que converte em um vínculo jurídico plasmado num Ordenamento Maior uma relação político-cultural travada entre os mandatários do poder político e o povo, ou seja, entre os representantes e seus representados.
O termo pode ser utilizado, também, para mencionar o fato de uma Constituição incorporar em seu texto uma miríade de temas afetos, ordinariamente, à legislação infraconstitucional, situação denominada por alguns de “constitucionalismo-inclusão”, a indicar a introdução, no texto da Lei Fundamental, de conteúdos normativos que são, por natureza, estranhos a esse documento político.
Na esteira desse avanço do direito infraconstitucional na Constituição, ensina o Ministro Luís Roberto Barroso (2009, p. 360-361), com assento na Constituição Brasileira de 1988:
“Quanto ao ponto aqui relevante, é bem de ver que todos os principais ramos do direito infraconstitucional tiveram aspectos seus, de maior ou menor relevância, tratados na Constituição. A catalogação dessas previsões vai dos princípios gerais às regras miúdas levando o leitor do espanto ao fastio. Assim se passa com o direito administrativo, civil, penal, do trabalho, processual civil e penal, financeiro e orçamentário, internacional e mais além. Há, igualmente, um título dedicado à ordem econômica, no qual se incluem normas sobre política urbana, agrícola e sistema financeiro. E outro dedicado à ordem social, dividido em números capítulos e seções, que vão da saúde até os índios.”
Agora a nossa Constituição deve ser vista pelos juristas, por inteiro – pois não há medida certa para sua aplicação, que está sempre e estará – acima de qualquer legislação ordinária, focada mais nos chamados direitos fundamentais nesse emaranhado legislativo. Por isso tudo, surge ateoria do diálogo das fontes, idealizada na Alemanha pelo jurista Erik Jayme, professor da Universidade de Helderberg e trazida ao Brasil por Claudia Lima Marques, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Essa tese teóricatem o fito de trazer ao intérprete uma nova ferramenta hermenêutica hábil a solucionar problemas de conflito entre normas jurídicas (antinomias) no sentido de interpretá-las de forma coordenada e sistemática, em consonância com os preceitos constitucionais