Ibitinga, Segunda, 25 de Novembro de 2024
O PERIGO DOS PRECEDENTES NO DIREITO BRASILEIRO

Relembro uma conversa antiga, de um bom advogado, de fora da terra. Contou-me ele que interpôs um recurso, em âmbito administrativo, num órgão federal, para Brasília. Para o cliente dele, coisa graúda. Na época, os meios de comunicação não eram como hoje e, por conta disso, foram – ele e o cliente – para a nossa Capital Federal. Hospedaram-se, cada um no seu apartamento. O advogado disse ao cliente que iria até o órgão responsável pelo julgamento, para dar uma assuntada no processo, se não havia nenhuma novidade. Chegou ao órgão e pediu o processo. A servidora, depois de dar uma rápida vasculhada, disse a ele que o processo estava com o relator, que estava para chegar em Brasília, se ele poderia deixar o local onde estava, que assim que chegasse, entraria em contato, por telefone. Deixou o número do hotel e o apartamento.

   Naquela noite foi surpreendido pela recepção do hotel de que havia uma senhora, que queria falar com ele, no apartamento. Como disse, um bom advogado que é, ficou um pouco assustado, porque ninguém sabia de seu paradeiro. Disse que desceria até a recepção e, assim o fez. Para seu espanto era a servidora que o havia atendido, na recepção pública. Pediu para ir ao apartamento para uma conversa. Não era sexo.

    Lá chegando ela foi direta: para ter o relatório favorável custaria alguns mil cruzados ou moeda que não me recordo ao certo. Falou para a seríssima servidora que confiava no trabalho feito, mas, que mesmo assim, precisava consultar o seu cliente, que estava no apartamento ao lado. Chamou o seu cliente e expos o caso. 

    O cliente – nesse caso corruptor ativo – concordou em pagar a propina solicitada e lascou um cheque (imaginem o grau da corrupção). O advogado ficou extremamente triste, desejou abandonar o caso. Ficou para o julgamento.

    Dia seguinte, a primeira pauta era exatamente o seu recurso. Batata. Parecer do Relator favorável integralmente ao brilhante trabalho do ilustre advogado, no que foi acompanhado, por unanimidade dos demais julgadores daquele recurso administrativo.

    O assunto seguinte, da pauta, era um caso idêntico, a mesma tese jurídica, só que envolvia tubarões da república e valores muitas vezes, milhares de vezes mais vultosos do que a caso julgado e que – por incrível que possa parecer, serviu de precedente, para os tubarões continuarem a nadar na correnteza lodosa da nossa república e a corrupção só fez aumentar.

    Muito bem: os precedentes são sempre perigosos. O que serve a Paulo, serve a João. O pau que bate em Chico, bate em Francisco.

    Cito esse caso, exemplar no nosso Brasil, para que fiquemos atento ao julgamento que começou dia 17/10 (quinta), no Supremo Tribunal Federal. Não estão preocupados com os milhares de encarcerados que vivem nos presídios dessa terra cabralina. Não estão preocupados com os inúmeros detentos que vivem em verdadeiras masmorras, como se um banho quente fosse algo de luxo para um ser humano. Como se usar o vaso sanitário, com mais dez, quinze ou vinte à sua volta, fosse necessário para um ser humano ser melhor; como se dar a ele um local apropriado para dormir fosse algo abominável pela sociedade. Tuberculose, aids e tantas outras doenças infectas contagiosas – jamais foi discutida de maneira franca na nossa Suprema Corte, porque a questão da Execução da Pena – não é problema dela. Ah! A Ministra Cármen Lúcia visitou presídios. O Ministro Gilmar Mendes foi pioneiro em fazer alertas, em visitar presídios. E daí..... Qual foi a solução?

   Ora vamos discutir o amplo direito de defesa, o contraditório, se o delator fala nas alegações finais antes ou depois. É isso que estão julgando? Não. Não é isso que estão julgando, tenham a absoluta certeza. Fosse isso, tantos são os presos que estão injustamente em presídios. Tantos são os condenados que furtaram (ou tentaram) levar comida, roupas para os filhos (crimes famélicos) e foram tratados como Chefes de grandes facções criminosas. Não tinha dinheiro sequer para a fiança. Flagrante delito, num furto que nem cana vai dar.

    Insisto, não é isso que estão julgando, desde o dia 17/10. Vão criar precedente na Suprema Corte, como naquele caso que mencionei acima. Muitos criminosos, os tubarões da república, que insistem em nadar no lodo da corrupção, daquele dinheiro que faz falta na saúde, na segurança pública, na escola pública, tão maltratada, irão para suas casas, normalmente grandes mansões. Vão para o exterior, porque o trânsito em julgado não aconteceu e, só poderão ser presos, por isso. Essa questão, para mim, é certa: todos – sem exceção – têm o mais amplo direito de defesa, vou além, até que se altere a Constituição Federal e o Código de Processo Penal, só podem ser presos, após esse trânsito em julgado. O erro, primário, é do legislador, da Constituição de 1988, que como sempre digo, deu muitos direitos e pouquíssimas obrigações.

   Mas isso vai melhorar para os pobres e miseráveis que estão naquelas masmorras? Evidentemente que não. Vai melhorar aos que sempre estão no andar de cima.

   Portanto, precedentes são extremamente perigosos, criam insegurança jurídica e subjetividade.

   Na minha época de estudante de direito, tinha uma matéria muito chata, chamada Filosofia do Direito. Hoje vejo quanta falta faz a filosofia no estudo do direito e que as aulas não eram tão chatas assim.

   No Brasil, o direito possui influência no sistema romano-germânico, conhecido como Civil Law (direito civil). O sistema Civil Law se baseia na lei devidamente positivada e codificada, ou seja, é a aplicação do direito com base no texto da lei, sendo que, na ausência de norma regulamentadora, ou quando o legislador for omisso, o Poder Judiciário se vale da jurisprudência (casos semelhantes já julgados pelo Poder Judiciário) para que o direito seja aplicado ao caso concreto.

    Já o sistema Common Law (direito comum) possui influência no direito anglo-saxão, cuja denominação é dada à fusão dos povos germânicos (anglos, saxões e jutos) que se fixaram no sul e leste da Grã-Bretanha no século V.

   Desta forma, “a Common Law se fundamenta na lei não escrita, no direito jurisprudencial e nos costumes; enquanto a Civil Law se alicerça na lei devidamente positivada e codificada. Vai continuar a corrupção e faltar filosofia.

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